Reviravolta! MPF entra com recurso impugnando sentença que favorecia Rafael Simões

“Causa espanto, outrossim, a forma despudorada com que os acusados admitem o ilícito,
mas buscam minimizar o fato, como se fosse normal agir como aqui narrado!”

O Ministério Público Federal manifestou-se, através do procurador da República Lucas Gualtieri, recorrendo da sentença proferida pela juíza Federal Tânia Zucchi de Moraes em relação à ação de improbilidade administrativa contra o prefeito de Pouso Alegre, Rafael Tadeu Simões e outras duas rés. A ação que envolveu improbidade administrativa, com pedido liminar de indisponibilidade de bens por terem violado princípios basilares da Administração Pública, bem como causado prejuízo ao erário e enriquecimento de forma ilícita, foi considerada improcedente pela juiza Tânia Zucchi.

Em síntese, a acusaçao é que em cinco oportunidades, nos dias 25/07/2014, 05/01/2015, 26/01/2016, 22/03/2016 e 23/01/2017 – desta última vez quando já empossado como prefeito de Pouso Alegre – foram desviados medicamentos e materiais que acarretaram prejuízo ao Hospital das Clínicas Samuel Libânio e SUS. Para tanto, foram inseridos dados falsos no sistema de informações com a finalidade de assegurar a captação dos insumos e medicamentos.

No recurso que impugna a sentença, o procurador Lucas Gualtieri destaca que foi reconhecido pelo próprio réu Rafael Simões, prefeito de Pouso Alegre, por ocasião do interrogatório prestado em juízo, que os medicamentos e agulhas tinham como destino a fazenda de sua propriedade e a realização de exames, no laboratório do Hospital das Clínicas Samuel Libânio, com amostras de sangue de animais, que foram feitos no interesse do prefeito Rafael Simões. “A relevância desse fato reside na presença de fortes suspeitas de que a realização dos exames em questão motivou, ao menos numa primeira oportunidade, os desvios de medicamentos no hospital”, complementa o procurador.

Para o procurador Lucas Gualtieri, ficou claro na instrução que todo o procedimento ilícito – lançamento de contas paciente falsas; indicação de valores com preço muito inferiores aos praticados, por vezes menores que os preços de custo, etc – foi adotado exclusivamente em favor do então Presidente da FUVS – atual prefeito de Pouso Alegre, com o intuito de beneficiá-lo, em detrimento do erário, da probidade e da moralidade.

Segundo consta no recurso, “com efeito, diferentemente do que possa parecer – e do que alegado pelos réus -, não havia, em absoluto, intenção de Rafael Simões em proceder ao pagamento dos materiais desviados, servindo o artifício de criar as contas-paciente fictícias como mecanismo para dar ares de legalidade aos atos dantes praticados”. E salienta: “fosse, de fato, a intenção do réu de “comprar” os medicamentos e materiais na farmácia do hospital, deveria, primeiro, ter havido prescrição médica, já que a amicacina era remédio controlado. Afora isso, deveria ter havido pagamento tão logo retirados os materiais do hospital, como acontece em qualquer estabelecimento. Ao contrário, entretanto, o que se constata é que somente muitos meses após o desvio – e até mesmo após a saída de Rafael Simões da direção da FUVS – foram emitidas notas fiscais referentes aos atendimentos fictícios. A maioria das notas fiscais foi paga pelo próprio réu Rafael Simões, mediante cheques nominais ao HCSL em momento muito posterior aos desvios, havendo inclusive faturas que não haviam sido quitadas até o ajuizamento das ações penal e de improbidade.”

O procurador aponta ainda, com as provas apresentadas, que “realizando-se a apuração dos valores que deveriam ter sido pagos pelo réu Rafael Simões com base na tabela para atendimentos particulares, e subtraindo-se desse valor os lançados nas notas fiscais pagas parcialmente pelo acusado, apurou-se um prejuízo efetivo de cerca de R$11.827,21, de modo que não houve “superávit”, como considerado pela sentença recorrida, mas sim efetivo prejuízo”.

A defesa de Rafael Simões não teve a pretensão de negar o inegável, ou seja, que os medicamentos, agulhas, seringas e outros materiais, destinavam-se ao tratamento dos animais de propriedade do prefeito de Pouso Alegre. De fato, a própria quantidade de medicamentos e materiais dispensada, em doses cavalares (quase que literalmente), desaconselharia versão diversa.

Para o MPF, a sentença desconsiderou as provas e depoimentos robustos da ação. Pela legislação vigente, porém, foram violados princípios basilares da administração pública “ao fazerem com que o acusado Rafael Tadeu Simões se locupletasse do erário, com o desvio dos materiais, incidindo tanto em atos de improbidade administrativa que atentaram contra os princípios da administração pública, quanto em atos de improbidade que causaram prejuízo ao erário e enriquecimento ilícito”.

Para finalizar, dentre as 67 páginas de sua petição intercorrente, o procurador Lucas Gualtieri demonstra seu inconformismo perante a sentença, da juíza Tãnia Zucchi de Moraes – que julgou a ação de improbidade administrativa improcedente. “Deveras, causa espanto tal afirmação, na medida em que atribui naturalidade a um típico ato de confusão entre o público e o privado, exemplo ordinário de ato de improbidade administrativa”.

E sustenta: “a citada confusão e falta de limites entre os bens públicos (eis que custeados em sua grande maioria com recursos do SUS) e o patrimônio do então Presidente da Fundação fica evidente em trecho do interrogatório prestado por Rafael Simões na ação penal que tramita na 2ª Vara da Subseção Judiciária de Pouso Alegre sobre os mesmos fatos. Naquela ocasião, sem qualquer pudor, o então interrogado se dirigiu ao magistrado presidente do ato e afirmou, referindo à prática de retirar materiais da farmácia: “É como se o senhor tivesse uma conta na sua farmácia”.

E complementa:”teria a decisão recorrida transformado o Hospital Samuel Libânio em uma farmácia aberta ao público, na medida em que considerou normal e lícita a dispensação de medicamentos a quem assim o desejar? Ou seria esse um privilégio assegurado apenas a uma casta abastada, representada por aquele que detinha o comando da entidade e seus asseclas? Caso a resposta seja afirmativa à primeira pergunta, de fato a ação mereceria a improcedência, mas seria preciso que se assegurasse a todos os interessados igualdade de tratamento perante a instituição que, embora privada, gere milhões de recursos públicos. Para que a decisão esteja correta, data vênia, deveria ser permitido que qualquer do povo, independente de classe social ou posição de prestígio, recebesse o mesmo tratamento dispensado ao Sr. Rafael Simões, que criou uma verdadeira conta particular na farmácia do HCSL, comprando “fiado” e com preço até inferior ao valor de custo!”

E o Ministério Público Federal encerra pedindo reparo à sentença prolatada e condenação por improbidade do prefeito de Pouso Alegre, Rafael Tadeu Simões, da secretária Municipal de Saúde de Pouso Alegre, Sílvia Regina e de Renata Risso em virtude do enorme conjunto probatório constante dos autos.

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