Justiça recebe denúncia do MPF e torna rés 22 pessoas pelo crime de organização criminosa. Na fábrica em Divinópolis o trabalho era escravo

Alguns ainda responderão por tráfico de pessoas, trabalho escravo e crime contra a saúde pública;
quadrilha falsificava e contrabandeava cigarros

A Justiça Federal recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF), com o apoio do Grupo Especializado de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), contra 22 pessoas pelo crime de organização criminosa armada, previsto na Lei 12.850/2013. Os denunciados atuavam na falsificação e contrabando de cigarros de marcas paraguaias em vários estados do Brasil. A denúncia é resultado da Operação Ilusio, deflagrada em 14 de novembro do ano passado, pelo MPF, Polícia Federal (PF), Receita Federal do Brasil (RFB) e Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

 

A operação resultou em 13 de prisões temporárias e 35 mandados de busca e apreensão em residências, galpões e empresas em Manaus (AM), Nova Ipixuna (PA), Capim Grosso (BA) e nas cidades paulistas de Barueri, Carapicuíba, Indaiatuba, Osasco, Santana de Parnaíba, São Caetano do Sul, São Paulo e Taiuva. A operação também foi realizada em Minas Gerais, nas cidades de Belo Horizonte, Divinópolis, Itaúna, Nova Lima, Nova Serrana, Pará de Minas, Pitangui e São Gonçalo do Pará.

Segundo a denúncia, entre 2018 e 2023, os acusados foram responsáveis pela constituição e funcionamento, em Minas Gerais, mas com ramificações em outros estados brasileiros, de sofisticada organização criminosa dedicada à sistemática prática de contrabando, tráfico de pessoas, trabalho escravo e lavagem de dinheiro. Segundo a investigação, o grupo criminoso tinha como principal modus

operandi a falsificação e comercialização, no Brasil, de cigarros de marcas paraguaias, como “Eight”, “San Marino”, “Gift” e “Mix”, que não podem ser produzidas, importadas ou comercializadas em território nacional.

Organização armada

Segundo o MPF, a organização criminosa armada era dirigida por um dos denunciados, que era o responsável por financiar a logística operacional que envolvia a fabricação de cigarros, compra de caminhões, galpões, compra de material gráfico, entre outras atividades. Em um segundo nível, ele recebia auxílio diretamente na gestão da organização, de outros três denunciados, sendo que estes também eram ajudados pelas esposas de dois deles na locação de galpões e emissão das notas ficais que eram adulteradas para o transporte dos cigarros.

A investigação demonstrou que os acusados operavam por meio de diversas empresas de fachada, que eram usadas para prospectar e alugar galpões no interior de Minas Gerais e de São Paulo, onde era instalado o maquinário para a fabricação clandestina de cigarros. Os integrantes da orcrim adquiriam tabaco, filtro e papel na região Sul do país, e material gráfico de empresas do setor vinculadas ao esquema ilícito.

O grupo criminoso também dispunha de armas e estava disposto a usá-las, mesmo contra as forças policiais, segundo a denúncia. Foram apreendidas armas de diversos calibres e munição com alguns membros do grupo. Em uma das interceptações feitas com autorização judicial, os integrantes da orcrim discutiram a possibilidade do uso de armas em abordagens policiais.

Trabalho escravo

Os galpões alugados ficavam sob a gestão de “gerentes”, com nível de comando intermediário na organização, e a mão de obra era atendida por trabalhadores paraguaios. Eles eram trazidos para o Brasil sob a promessa de trabalho lícito, mas eram obrigados a trabalhar de forma ininterrupta e com restrição da liberdade.

Durante a deflagração da operação, em um dos galpões, localizado em Divinópolis (MG), já identificado como usado pela organização criminosa, os fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e a PF se depararam com uma linha de produção de cigarros bem estruturada e com a presença de 14 pessoas trazidas do Paraguai que estavam trabalhando no local, demonstrando o caráter transnacional da organização criminosa.

Essas pessoas foram aliciadas em seu país com a promessa de trabalharem em confecções em São Paulo, recebendo bons salários, mas tiveram seus telefones celulares confiscados e foram conduzidas com olhos vendados até a fábrica clandestina, em Minas. No local, passaram a trabalhar em condições análogas às de escravo. Eram submetidas a situações degradantes, como jornada de trabalho exaustiva e extensa (12 horas por dia) sem folgas, restrição completa de locomoção e até mesmo comunicação. Eles ficaram incomunicáveis e tolhidos de suas liberdades, de forma que eram obrigados a permanecer dentro da própria fábrica clandestina, a qual dispunha de alojamento com dormitório e cozinha.

Nesse contexto, os acusados, em proveito da organização criminosa da qual faziam parte, promoveram atividade industrial irregular, mantiveram em depósito, venderam, receberam e ocultaram, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial e industrial, falsificações de cigarros de marcas paraguaias, mercadoria proibida pela lei brasileira e substância nociva à saúde. Da mesma forma, fizeram uso de documentos públicos falsificados, supostamente emitidos pelo Ministério da Fazenda do Paraguai, para dar aparência de legalidade/veracidade aos cigarros falsificados no local.

Em razão disso, o MPF denunciou também os três líderes da organização criminosa pelos crimes de tráfico de pessoas (art. 149-A), redução à condição análoga à de escravo (art. 149), contrabando (art. 334-A), fabricação de substância nociva à saúde (art. 278) e uso de documento falso (art.304) combinado com falsificação de documento público (art. 297), todos do Código Penal. Outros integrantes intermediários da organização que atuaram diretamente na locação do galpão, administração do local e gestão da fábrica de cigarros também foram denunciados. No último dia 16 de janeiro, ao receber integralmente a denúncia do MPF, a Justiça Federal levantou o sigilo dos autos.

Com informações Assessoria de Comunicação Social/Ministério Público Federal em Minas Gerais