Da pesquisa ao mercado: tecnologia desenvolvida na UFLA aumenta tempo de conservação do alimento para o gado
Celebrada a segunda transferência de tecnologia da UFLA
A Universidade Federal de Lavras (UFLA) formalizou, em maio deste ano, sua segunda transferência de tecnologia para o mercado por meio de uma pesquisa científica que permitiu isolar, caracterizar e selecionar bactérias capazes de agir favoravelmente na fermentação de material ensilado (material vegetal utilizado para alimentar rebanhos e armazenado em silos). Em colaboração com a empresa francesa de fermentação microbiológica Lallemand SAS, por meio de Acordo de Cooperação Técnica, a nova tecnologia desenvolvida tem o diferencial de utilizar bactérias de ácido láctico que melhoram a estabilidade aeróbia da forragem ensilada, o que impacta na conservação e durabilidade desse material.
As bactérias Lactobacillus hilgardii cepas Sil 51 (CCMA 0170, agora chamada CNCM I-4784) e SIL 52 (agora chamada CNCM 1-4785) foram isoladas e purificadas da silagem de cana-de-açúcar (Saccharum spp.) e demonstraram, entre outras características, essa capacidade de aumentar a estabilidade aeróbia da silagem. Essa estabilidade leva à redução do crescimento de microrganismos indesejáveis como mofos e leveduras, reduzindo as perdas de matéria seca.
Os responsáveis pelo estudo são as professoras da UFLA Rosane Freitas Schwan, do Departamento de Biologia (DBI/ICN), Carla Luiza da Silva Ávila, do Departamento de Zootecnia (DZO/FZMV), e o professor aposentado José Cardoso Pinto. A tecnologia desenvolvida (as cepas identificadas como inoculantes para silagem e o método de uso destes inoculantes) está apta para ser transferida para o ambiente comercial e tem potencial para o mercado de inoculantes. “A tecnologia trata de uma forma de utilização de uma espécie ainda não utilizada comercialmente, sendo uma cepa selecionada especificamente para a silagem e que mostrou maior eficiência. Para o mercado, representa uma nova geração de um produto que foi extensivamente estudado e comprovado antes de ser utilizado. Existem poucos grupos de pesquisa no mundo que atuam na seleção criteriosa de inoculantes para silagem”, esclarece a professora Carla.
A nutrição adequada do gado, seja na pecuária leiteira ou de corte, é um dos pontos que mais preocupam o pecuarista. A ensilagem, prática de conservação de forragens mais utilizada mundialmente, importante para a pecuária brasileira e mundial, surge como solução para adequar o alimento às exigências dos animais e garantir disponibilidade de alimento o ano todo.
No processo, a forragem verde é cortada, compactada e protegida com a vedação do silo. A criação de um ambiente ausente de gás oxigênio, favorável para fermentação e produção de ácido lático, resulta na queda do pH e, assim, é inibido o crescimento de microrganismos deterioradores indesejáveis, bactérias ou fungos. Graças ao controle da fermentação, a perda nutricional é pequena e o material produzido é conservado por maior período de tempo.
O projeto se iniciou em 2005, como projeto de doutorado da professora Carla Ávila. O tempo médio para confirmação do resultado obtido na primeira forrageira estudada, de cana-de-açúcar, foi de cinco anos, a partir da qual o efeito foi estudado em outras plantas forrageiras. Porém, o tempo para gerar a tecnologia como está no mercado foi de aproximadamente dez anos.
Conforme informam as pesquisadoras, para os produtores, a silagem mais estável é aquela que permanece mais tempo sem sofrer deterioração após abertura do silo ou em qualquer momento em contato com o oxigênio. Significa uma silagem com menores perdas; essas perdas são perdas do material ensilado (perda de matéria seca), ou perdas na qualidade por crescimento de microrganismos indesejáveis (que causam algum problema) ou produção de compostos indesejáveis, como microtoxinas. Essa atuação propicia também, maior flexibilidade de abertura do silo.
A Universidade Federal de Lavras e as transferências de tecnologia
A cessão dessa propriedade intelectual, que é uma das modalidades de transferência de tecnologia, foi pactuada em maio de 2022, entre a UFLA e a empresa multinacional Lallemand SAS, concretizando a segunda transferência de tecnologia da Universidade. O contrato foi celebrado prevendo a aquisição dos 50% dos direitos da UFLA sobre a patente, negociado no valor de 200 mil euros, o que se torna importante fonte de recursos para o financiamento da ciência, tecnologia e inovação, dada a escassez de recursos públicos destinados a esse fim.
Na condição de coordenador de Inovação e vice-diretor do Núcleo de Inovação Tecnológica da UFLA (Nintec), o servidor Rafael de Oliveira Rezende explica que o Marco Legal da CT&I assegura aos criadores participação mínima de 5% e máxima de 1/3 nos ganhos econômicos advindos das transferências de tecnologias de sua titularidade. A Política de Inovação da UFLA dispôs, em seu Artigo 33, o percentual máximo, distribuindo os recursos auferidos na proporção de 1/3 para os inventores; 1/3 destinado ao financiamento de projetos, preferencialmente de autoria dos respectivos inventores; e 1/3 para o Núcleo de Inovação Tecnológica aplicar em objetivos institucionais de pesquisa, desenvolvimento e inovação, inclusive na gestão da política de inovação.
O vice-diretor acrescenta que, além da relevância acadêmica e intelectual do conhecimento que é gerado dentro da Universidade, a comunidade acadêmica tem essa alternativa para aplicação desses ativos, sejam eles protegíveis (licenciamento) ou não (transferência de know-how). É possível transferir a tecnologia para o setor produtivo ou até mesmo criar startups e spin-offs que podem ser desenvolvidas, ganhando maturidade e robustez, no âmbito da Incubadora de Empresas de Base Tecnológica – Inbatec e do Parque Científico e Tecnológico.
O vice-diretor reitera que o Nintec está trabalhando para transformar mais ideias e invenções em produtos úteis para a sociedade, por meio de mecanismos de inovação como: acordos de parceria para desenvolvimento de pesquisa e inovação em conjunto com empresas, fomento a criação de startups e spin-offs, outorga de uso de laboratórios e equipamentos e da própria transferência de tecnologia ao setor produtivo, estando o Núcleo aberto às demandas externas e atuando em busca de interessados nas tecnologias com potencial de mercado.
A respeito da importância de contratos de transferência, cessão ou licenciamento de tecnologias para a UFLA, o reitor professor João Chrysostomo de Resende Júnior declara: “é com imensa satisfação que assinamos a segunda transferência de tecnologia da UFLA. Apesar de historicamente sermos uma instituição de pesquisa de referência nacional e mundial e de termos um corpo de servidores altamente qualificado, o nosso histórico em transferência de tecnologia está ainda aquém do desejado. Nosso compromisso tem sido estruturar o Nintec e desatar os nós institucionais que travavam essas importantes ações.”
Com essa transferência de tecnologia, a UFLA fomenta a ciência, tecnologia e inovação, articulando as atividades do setor público com a iniciativa privada, e promove o aprimoramento do setor produtivo nacional e internacional, além de contribuir para o desenvolvimento do mercado brasileiro e gerar recursos que serão investidos na continuidade e no desenvolvimento de novas pesquisas científicas e tecnológicas.
“Tivemos a felicidade de dotar o Nintec com servidores altamente competentes e comprometidos, que estão realizando um trabalho excelente e, agora, dão suporte adequado aos docentes para que os produtos inovadores desenvolvidos na UFLA possam resultar nessas transferências de tecnologia, pois, dessa forma, todos ganham: os inventores, a UFLA e, principalmente, a sociedade. Parabenizo a todos os envolvidos nesta grande realização”, finaliza o reitor.