UFLA desenvolve, em parceria internacional, antídoto para casos de contaminação por agentes de guerra química
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Composto K203 é atualmente o melhor antídoto do mundo para casos de contaminação provocada pelo Tabun, gás tóxico incolor desenvolvido como arma química de guerra durante a Segunda Guerra Mundial
Pós-doutoranda Tássia Silva Tavares egressa da UFLA na República Tcheca onde atualmente continua suas pesquisas na Universidade Charles
Armas químicas de guerra vêm sendo utilizadas pelo homem há centenas de anos. Porém, a descoberta dos compostos químicos orgfanofosforados na Segunda Guerra Mundial têm potencializado seus efeitos, causando tragédias como a que ocorreu em 2018, na Síria, onde dezenas de civis, entre eles mulheres e crianças, morreram ao serem atingidos por substâncias tóxicas. De acordo com o professor do Departamento de Química (DQI) da UFLA, Teodorico de Castro Ramalho, os custos e a facilidade para serem sintetizados fazem desses agentes de guerra química uma grande ameaça internacional. “Essas substâncias são mais baratas e, por isso, são realizados controles rigorosos em relação a alguns defensivos agrícolas que contêm organofosforados, ou seja, podem ser utilizados na fabricação de agentes de guerra química”.
Antídoto
Na UFLA, os estudos no DQI começaram com o propósito de conhecer o mecanismo de ação dos compostos organofosforados menos tóxicos, tendo como o primeiro alvo a ser estudado o glifosato, um dos organofosforados mais utilizados como ingrediente de vários herbicidas. “Pesquisamos várias vertentes desses organofosforados para projetar compostos que tenham o menor impacto ambiental e possam ser empregados com segurança na agricultura, como também desenvolver compostos que possam ser utilizados como ‘antídotos’ para os agentes de guerra química”, esclarece o professor.
Um desses antídotos é o composto “K203”, que foi desenvolvido pelos pesquisadores brasileiros em parceria com outras instituições, para casos de uma contaminação pelo gás tóxico Tabun. Esse organofosforado, que é mais tóxico, inibe a enzima acetilcolinesterase, que está presente em todo ser vivo e é responsável pela finalização da transmissão dos impulsos nervosos. Então, a inibição da acetilcolinesterase resulta em uma estimulação excessiva do sistema nervoso central e periférico que leva o indivíduo à morte. Porém, pesquisas recentes mostraram que é possível reativar essa enzima com a utilização de um antídoto. O K203 foi o que promoveu o maior percentual de reativação da enzima acetilcolinesterase após a contaminação provocada pelo gás Tabun.
Teodorico comenta os resultados: “tentamos otimizar a concentração desse antídoto para que a pessoa possa sobreviver. A parte de toxicologia deu bons resultados e novos testes serão feitos para melhorarmos esse antídoto e transformá-lo em algo universal, que poderá abranger outros agentes de guerras químicas, não apenas para o Tabun”.
As pesquisas na UFLA começam no Laboratório de Modelagem Molecular. O pós-graduando em Agroquímica Ander Francisco Pereira, que faz parte da equipe, realiza simulações computacionais utilizando técnicas específicas modernas. “Nós analisamos o modo de interação de potenciais reativadores da acetilcolinesterase, bem como a barreira energética para a reação de reativação da enzima, a fim de projetar compostos com atividades melhoradas”. Da simulação, são criadas as melhores condições para que os experimentos sejam realizados fora do País. “No Brasil, não são permitidos diretamente testes com agentes de guerra química. Por isso, fazemos a parte teórica, ou seja, projetamos as moléculas, e um grupo experimental da República Tcheca sintetiza e testa essas moléculas que criamos”, esclarece o professor Teodorico.
As pesquisas são também realizadas mediante um acordo de cooperação entre a UFLA, o Instituto Militar de Engenharia (IME) e as universidades de Hradec Králové, na República Tcheca e a Vrije Universiteit, de Amsterdam, na Holanda. Ao longo dos últimos anos, mais 30 artigos científicos em periódicos internacionais foram publicados com esse tema e realizado um pedido de patente.
Biorremediação
Outra linha de pesquisa é a chamada biorremediação, que seria uma espécie de “vacina” contra a contaminação. O doutorando Alexandre Alves de Castro comenta como o método funciona. “Usamos enzimas degradantes que, ao chegar na corrente sanguínea, encontram os organofosforados antes que eles cheguem à enzima acetilcolinesterase”. O pesquisador desenvolveu partes de sua tese na Holanda, onde testes de reatividade em estruturas de compostos organofosforados puderam trazer esclarecimentos sobre a toxicidade das moléculas desses compostos.
Contaminação por pesticidas e herbicidas
A exposição sem a devida proteção a produtos, como inseticidas e herbicidas, durante a aplicação na lavoura também pode causar diversos males à saúde. Por isso, alguns trabalhos do grupo de pesquisa ainda em desenvolvimento sugerem o uso de antídotos também para esses casos. “Esta é uma outra vertente do nosso projeto. Estudamos como usar um bom antídoto também para casos de contaminação por agroquímicos, para abranger o tratamento de intoxicação provocada por esses produtos”, finaliza o professor.